A disparidade salarial entre mulheres negras e não negras no mercado de trabalho é um reflexo direto das desigualdades históricas e estruturais presentes na sociedade brasileira. A discriminação racial e de gênero cria obstáculos adicionais para as mulheres negras, limitando suas oportunidades de emprego, crescimento profissional e acesso a salários justos.
O Ceará não é uma exceção, mas sim um exemplo dessa realidade nacional. Essa disparidade salarial revela não apenas a existência de preconceitos e estereótipos arraigados, mas também a necessidade urgente de políticas públicas e ações afirmativas que combatam essas desigualdades.
Investir em programas de capacitação profissional específicos para mulheres negras, promover a conscientização sobre os impactos do preconceito racial e de gênero no mercado de trabalho, além de implementar medidas de transparência salarial e políticas de igualdade de oportunidades são algumas das formas de enfrentar essa questão.
É fundamental que o governo, as empresas e a sociedade em geral se unam para criar um ambiente de trabalho mais inclusivo e equitativo, onde todas as pessoas, independentemente de sua cor, raça ou gênero, tenham as mesmas oportunidades de sucesso e desenvolvimento profissional.
Para se ter ideia, no Ceará, as mulheres negras têm o salário 21,7% menor do que as não negras, conforme o 1º Relatório Nacional de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, dos ministérios do Trabalho e Emprego (MTE) e das Mulheres.
Enquanto a mulher parda ou preta tem uma remuneração média de R$ 2.460,01, a branca recebe R$ 3.143,57. Quando comparados os salários de homens negros (R$ 2.829,74) e mulheres negras (2.460,01), a desigualdade de gênero persiste, totalizando discrepância de 15%.
No entanto, os homens negros recebem salários 27,7% menores do que as mulheres não negras. No total, 1.355 empresas cearenses responderam ao questionário, com 539,4 mil pessoas empregadas. Ou seja, os dados consideram apenas o mercado formal.
Para a cientista-chefe da Secretaria do Trabalho (SET) e professora da Universidade Federal do Ceará, Jacqueline Franco, os dados expõem a necessidade de políticas públicas para equiparação de salários.
“Já existe a questão de gênero, com a mulher recebendo menos que o homem. Além disso, tem a mulher negra com salário menor na comparação com a não negra. Isso é reflexo da política segregacionista no Brasil”, avalia.
Segundo Franco, no Ceará, será realizado um projeto-piloto para tornar mais clara a desigualdade de gênero, nos bairros São João do Tauape e Lagamar, a partir deste mês. Na prática, será feita uma pesquisa de busca-ativa para identificar as mulheres que atuam no trabalho de cuidado, ou seja, cuidam de filhos ou familiares e estão fora do mercado.
ACÚMULO DE QUESTÕES ESTRUTURAIS
A análise da coordenadora Celecina de Maria Veras Sales ressalta uma importante perspectiva sobre a desigualdade salarial enfrentada pelas mulheres, especialmente as mulheres negras. A referida "dupla violência social" refere-se à interseccionalidade das discriminações de gênero e raça que essas mulheres enfrentam.
Essa interseccionalidade significa que as mulheres negras não apenas enfrentam os desafios relacionados à sua identidade de gênero, como também estão sujeitas a discriminações e obstáculos adicionais devido à sua raça ou cor de pele. Essa combinação de fatores resulta em uma experiência única de marginalização e exclusão no mercado de trabalho e na sociedade como um todo.
Portanto, entender a desigualdade salarial como uma "dupla violência social" é reconhecer que as mulheres negras enfrentam não apenas uma, mas duas formas de discriminação que se sobrepõem e se reforçam mutuamente, exacerbando as desigualdades existentes.
Para abordar efetivamente essa questão, é necessário adotar uma abordagem interseccional que reconheça e confronte as complexidades das experiências das mulheres negras no mercado de trabalho, implementando políticas e programas que abordem tanto as questões de gênero quanto as de raça de maneira integrada e holística.
DESIGUALDADE EM TODOS OS NÍVEIS DE CARREIRA
A desigualdade salarial acompanha as mulheres em praticamente todos os níveis de ocupação, somando-se ao acesso limitado a cargos de liderança. No Ceará, em cargos de dirigentes e gerentes, as mulheres ganham 29,4% a menos que os homens.